" Poema"


  • Trouxe o Sol à poesia,
    mas como trazê-lo ao dia? 

    No papel mineral
    qualquer geometria
    fecunda a pura flora
    que o pensamento cria

    Mas à floresta de gestos
    que nos povoa o dia,
    esse sol de palavra
    é natureza fria

    Ora, no rosto que, grave,
    riso súbito  abria,
    no andar decidido
    que os longes media,

    na calma segurança
    de quem tudo sabia,
    no contato das coisas
    que apenas coisas via,

    nova espécie de sol
    eu, sem contar, descobria:
    não a claridade imóvel
    da praia ao meio-dia,

    de aérea arquitetura
    ou de pura poesia:
    mas o oculto calor
    que as coisas todas cria.


    [João Cabral de Melo Neto]


                                                                         

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